Por Júlio César Barros, da Revista Pesquisa FAPESP Online
Agência FAPESP – É possível prever a evolução das espécies usando cálculos matemáticos? De que forma a separação geográfica contribui para a diversidade genética dos seres vivos? Foi em busca dessas respostas que o físico Marcus de Aguiar aplicou modelos teóricos a sistemas biológicos para criar um programa de computador capaz de simular a evolução de populações ao longo de múltiplas gerações e, de quebra, ajudar a entender o papel do espaço físico no surgimento de novas espécies.
Sem deixar o laboratório da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Aguiar e a equipe de pesquisadores liderada por ele simulou virtualmente o acúmulo de transformações pelas quais passou a ave asiática felosa (
Phylloscopus trochiloides). Isso só foi possível, diz o professor, graças à enorme quantidade de dados coletados por grupos de cientistas sobre o pássaro. “Comparamos os resultados obtidos através da simulação feita no computador com as informações reunidas ao longo de décadas de observações científicas”, conta.
O grupo sugere no estudo
Evolution and stability of ring species, publicado em 12 de março na revista
Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS), que diferenças genéticas não se acumulam apenas quando uma população é forçada ao isolamento geográfico. Como boa parte dos biólogos acredita hoje em dia, o surgimento de novas espécies pode se dar quando o isolamento é apenas parcial ou mesmo sem quaisquer barreiras geográficas.
Há 10 mil anos, com o fim da última era glacial, a população de felosas, que se encontrava até então confinada ao sul do platô tibetano, pôde se espalhar por um território enorme em torno dessa área na direção norte depois que o gelo derreteu e a mata se desenvolveu.
Hoje, exemplares dessa espécie de ave são encontrados numa região muito extensa em forma de anel em torno do platô que, de norte a sul, vai do norte da Rússia à Índia, e de leste a oeste, compreende o litoral da China e o Leste Europeu. O centro dessa área circular, conhecido como platô tibetano, não apresenta condições que permitam a presença deste pássaro.
Ao introduzirem no modelo de computador algumas variantes, como taxas de reprodução, mortalidade, deslocamento ou mutação genética, os cientistas puderam simular a expansão da população de modo semelhante ao que ocorreu após o fim da era do gelo. A população, inicialmente confinada a uma região mais ao sul, cresceu contornando uma barreira, nesse caso o platô. No entanto, os dois extremos da população que voltaram a se encontrar ao norte da barreira não se reconhecem mais. Efetivamente é como se fossem espécies distintas.
“Esse processo evolutivo é descrito de forma bastante realista pelo programa. A importância do trabalho é que, com o modelo, é possível simular o que pode ocorrer no futuro. A previsão da equipe é de que esse anel de pássaros deve realmente ‘especiar’ – se quebrar em espécies distintas – dentro de aproximadamente 30 mil anos”, declara o professor.
Em 2009, o grupo de Aguiar já havia anunciado a criação do modelo matemático que prevê o desenvolvimento das espécies usando a Física Matemática. Para mais informações, leia o artigo
Biodiversidade sem fronteiras, publicada na edição 162 da Revista Pesquisa FAPESP, em agosto de 2009.
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